20.5.15

{Não posso adiar o amor para outro século
não posso
ainda que o grito sufoque na garganta
ainda que o ódio estale e crepite e arda
sob montanhas cinzentas
e montanhas cinzentas}


Lê novamente o poema de António Ramos Rosa, escrito a lapiseira azul nas costas de um talão do supermercado da D. Arminda. Sorri ao ler também a lista das compras, como se o pão centeio e o quilo de laranjas fossem promessa de um pequeno-almoço depois do grito. Quem teria perdido na calçada tamanha preciosidade? Guarda o papel no bolso da gabardine, sentindo-se a fiel guardiã de um tesouro sagrado. Às primeiras gotas de chuva, corre em direcção à  banca da fruta. Não se pode adiar o coração, tão pouco as primeiras cerejas do Fundão.